quinta-feira, 24 de abril de 2014


Prosa (falsamente) poética. 

Tinha tanto pra dizer, mas engoli.
Assim como engoli cada lágrima que escorria pelo meu rosto
Engoli o catarro, engoli a fome e a sede, engoli as vontades
Definhei.

Engoli a rejeição e cada ofensa que passou pela minha cabeça
A que faz de conta que comanda, que me faz pensar que o racional é maior.

A estranha distancia
De um dedo, de um sopro, de um cílio, de um lábio
A estranha proximidade
De uma conversa sem sentido, de argumentos, de relutâncias, de ausências

Me abraça,
Forte, leve, constantemente, por um instante

Me toca
Como sempre, como antes

-Pra sempre-






segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Aberta a estação de caça às pessoas sorriem.


Muitas notícias foram veiculadas das mais diversas formas sobre os fatos acontecidos no último domingo (05/03/12) no Largo da Ordem, em Curitiba. O bloco Garibaldis e Sacis promove um dos eventos mais tradicionais no âmbito da cultura popular na cidade. Pessoas de todas as idades, cores e classes festejam durante os quatro domingos que antecedem o carnaval na festa mais plural, colorida e feliz que se pode fazer ao ar livre, sob um céu maravilhosamente azul, aquecidos pela batida da bateria e pelo sol que vem junto com os foliões alegrar as ruas dessa cidade cinza por natureza.

As cores foram embora, entretanto, quando tiros começaram a vir de repente e toda a multidão correu na mesma direção, como um bando de animais que estavam sendo caçados – sim, é assim que eu me senti, como um animal sendo caçado! O bloco tinha acabado a apresentação e os músicos estavam recolhendo seus equipamentos. Passado isso, as pessoas permaneceram na rua porque ainda cantávamos e festejavamos porque a noite estava extremamente agradável para ficar ao ar livre. Ouvimos, então, um som muito forte que pensamos ser rojões, mas com a repetição destes e com os gritos da multidão, percebemos que se tratava de algo muito mais grave. No local estavam famílias, grávidas, cadeirantes, estudantes, foliões, PESSOAS! Ninguém escapou da repressão policial. Em menos de cinco minutos a musica parou e só podíamos encontrar as pessoas pelo choro e pelos gritos. Uma nuvem de gás tomou conta de todo o local e fomos para o mais longe que podíamos. A multidão de foliões se dispersava, mas os homens da RONE (Rondas Ostensivas de Naturezas Especiais) continuavam a atirar na nossa direção com balas de borracha e gás de efeito moral. Meus olhos ardiam e sentia minha pele queimar. Não conseguia ver muito bem o que acontecia, mas o som dos gritos de pessoas inocentes é algo que vai ficar na minha cabeça por muito tempo. Carregamos um amigo que não conseguia respirar por conta do gás, ao mesmo tempo em que ligávamos para outros amigos que estavam perdidos no meio da barbárie.

Em vinte minutos de ação, todas as entradas do Largo da Ordem estavam bloqueadas por pelo menos três viaturas em cada esquina, sendo que entre as viaturas estavam algumas da Guarda Municipal, da RONE e da Polícia Militar.

Durante todo o período que antecedeu o evento, acompanhamos via algumas redes sociais o esforço dos organizadores do bloco para conseguir mais estrutura para a realização do evento, incluindo, claro, reforço na segurança. Há notícias de que haviam 20 policias fazendo a ronda no evento, que tinha mais de 5 mil pessoas. Eu, particularmente, não vi nenhum. Mais uma vez vemos o descaso das instituições já falidas do nosso sistema, que preferem punir todos os presentes a estar de forma efetiva no evento, fazendo um trabalho preventido a situações de vandalismo ou qualquer outra que atentasse contra a ordem no espaço. Prefere-se sempre a barbárie como forma de resolução dos problemas. Talvez algo que me doa muito também, seja o fato de que algumas pessoas ainda acham certo reprimir uma multidão pacífica em um ato claramente premeditado, balear e hospitalizar a todos, para que a “ordem” seja reestabelecida.

Esse relato foi escrito por mim, mas está carregado por opiniões e angústias de outras tantas pessoas que estavam lá ou que simplesmente se sensibilizaram com o ocorrido. Curitiba é uma cidade que ostenta muitos rótulos. É uma cidade onde colocar música classica no transporte coletivo é a forma de propagação da dita “cultura”. Voltamos, como muitos disseram, à ditadura. Temos novamente um toque de recolher e uma cidade cinza – cinza na infelicidade das pessoas, na truculência do governo, da polícia e dos “poderosos, mas vermelha no sangue de inocentes que foi derramado, na nossa indignação e na força que tiramos disso para continuarmos lutando!

Júlio Marques

Universitário, curitibano, folião, cidadão, HUMANO.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Chatarrero


En una noche de insomnio se me cayó como una piedra en la cabeza. Muy fuerte y sensible, a la vez. Me hace latir más fuerte el corazón cuando se le (me) escapa una lágrima. A veces no importa el camino que uno sigue, no importa que cosas hace ahora: su pasado, las chatarras de su vida, jamás le dejarán, no importa a que sitio vaya o que mentiras quiera contar como verdades, siempre sabrá que lo perdido o lo ganado en el pasado sigue sumergido más allá de su conciencia. Un día se podrán ver en la orilla de su sien – se podrá echar un vistazo en esas oscuras heridas que se volvieron sus recuerdos y sus esperanzas.




quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Vida de Morte

Sempre achou que a vida era cinza e amarga aos seus olhos.

Nasceu numa linda manhã de sol, de um sábado 14. Como em toda boa sexta feira 13, muitas coisas deram errado na vida dos seus pais nas horas que antecederam a sua chegada, mas não acreditava nessas crendices. Teve uma infância dentro dos tediosos padrões esperáveis, desejáveis e aceitáveis: vivia numa rua tranqüila, na sua confortável casa de classe média, tinha um cachorro, um quarto só pra ele e, por ser filho único, todas as suas vontades feitas por seus pais. Não tinha muitos amigos, verdade, mas não ligava muito pra isso, achava-se tão auto-suficiente que nunca teve vontade de correr com sua bicicleta enferrujada junto com os outros meninos da sua rua, que tinham quase a mesma idade; nunca quis ficar com as unhas cheias de terra depois de uma tarde jogando bolinha de gude; nunca quis explorar os terrenos vazios que ficavam entre a sua casa e o pequeno riacho, como faziam os outros nos dias de temperatura mais amena; nunca quis saltar do alto da figueira em direção ao rio e espirrar água em todos que ficavam à margem – gostava de sentar-se só, sempre, no grande pedregulho que dava um bom panorama daquele lugar todo, até onde os olhos alcançam. Cresceu assim.

No colegial gostava de algumas aulas e de outras não, claro. Gostava das aulas de matemática, química e física – odiava as práticas de educação física, achava desnecessária e insuportável a idéia de suar, depois de intermináveis 50 minutos correndo de um lado para o outro, e ficar fedendo o resto do período, até chegar a hora de retornar a casa, cabulava essas aulas e sentava-se no alto do muro do colégio para ficar olhando o horizonte: como estudava pela manhã, gostava de ver o despontar dos primeiros raios do amanhecer; gostava também dos dias de neblina, onde não se podia ver nada, além do opaco brilho dos faróis dos carros que passavam vez ou outra. Era inconstante.

Entrou no ensino médio sem nunca ter repousado os seus lábios sobre os de outra pessoa. Uma vez quase beijara uma menina da sua turma, num dos enfadonhos jogos juvenis que todos faziam, mas no exato momento do quase lamentável beijo, o sinal tocou e todos correram, pois era a última aula. Teria gostado? Nunca saberia...

Nunca se interessava por ninguém até o final do segundo ano, quando um menino novo mudou-se para a cidade e entrou na mesma turma que ele. As coisas mudaram um pouco. Sentiu calafrios quando ele entrou. Tinha uma aparência um tanto sombria, parecia-se muito com ele próprio, às vezes, mas achou que não passava de uma primeira impressão. Sentou-se no fundo, na cadeira vaga ao seu lado, na qual ninguém nunca queria sentar. Tornaram-se parceiros de laboratório. Começaram a estudar juntos para os exames. Aprenderam mais do que os conteúdos escolares. Já não se sentava sozinho na grande pedra. Já não andava sozinho de bicicleta. Já não passava frio nas noites de inverno. No início seus pais não questionaram sobre a repentina amizade e nem pelo grau de aproximação dos dois; sempre o incentivaram a ter amigos da sua idade e a fazer coisas “normais”. Perderam um pouco a noção dos limites.

Um dia sua mãe entrou no quarto e o amigo não estava deitado no chão, no colchão de hóspedes, mas sim na apertada cama de solteiro, que não parecia grande o suficiente para duas pessoas normais, mas que era perfeita para o tamanho dos corpos esguios que ali repousavam. Hesitou e achou melhor não causar nenhum alarde pela primeira impressão, podia estar errada, precipitada. Saiu para trabalhar e deixou um bilhete dizendo que queria conversar com o filho quando voltasse. Ele não pareceu alarmado com isso, visto que sempre conversavam, mesmo que fosse sobre o tempo. À noite estava sentado frente à TV, desligada, desligado. Sua mãe sentou-se e questionou sobre a proximidade do colega e se ele sabia que o mesmo poderia ter segundas intenções com ele, inocente. Mal sabia ela. Discutiram. No fim, muitas portas foram batidas e muitas lágrimas foram derramadas. No dia seguinte, na escola, encontraram-se e contou a ele tudo o que tinha acontecido. Reconfortou-lhe.

Passaram a viver como o cão. Encontravam-se às escondidas. Faziam o que podiam onde não deviam. Um dia foram pegos no vestiário do colégio pelos outros meninos da turma, numa típica cena de cinema, quando cabulavam a aula prática para mais um furtivo encontro. O desfecho, como não podia deixar de ser, foi trágico. Nunca chorara tanto na sua vida. Nunca sofrera tanto com a dor de outra pessoa. Passou a semana toda ao lado do leito. Não comia. Sua mãe tentou dissuadi-lo de ficar ali, mas seus esforços foram inúteis. Finalmente deixou-se levar. Não sabia o que tinha sido mais longo, a espera pela melhora que nunca aconteceu ou a ida à despedida que nunca queria que terminasse.

Postou-se ao lado do caixão e dali não saiu em nenhum momento. Antes de baixarem a tampa, repousou os seus naqueles lábios cinzentos e frios, como nunca fizera antes. Sentiu-se amaldiçoar, maldisse o seu beijo mortal e jurou pela sua vida que nunca mais tocaria outros lábios. E não o fez.

Já não saia de casa, do quarto. Padeceu ali, solitário como começou.

Beijou-se no espelho, um dia. O beijo de adeus.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Desvivida. [2]

É engraçado como, às vezes, a vida das pessoas parece toda alicerçada em contradições. Acho curioso pensar como o que se diz e o que se faz não estão nem minimamente ligados.

Certa vez conheci uma pessoa que se dizia solitária por opção. Não prendia raízes e nem criava estabilidade; constante era tudo o que deveria existir na sua vida, tudo deveria ser passageiro; não queria algo que gerasse responsabilidades, conflitos e mesmo as alegrias que algo estável traz. Pois bem: qual o problema de se quebrar alguns paradigmas nessa nossa vida monótona e clichê? É curioso ver como ele – você – se mostra cada vez mais entregue, cada vez mais envolvido e, ao mesmo tempo, tenta se desvencilhar, se afastar, se esquivar. “Só quero te fazer feliz!”, “Não quero te fazer mal nunca.”, Não quero que você se afaste de mim, apesar de tudo. Não consigo pensar em ficar um dia sem falar com você ou sem te ver.”. Talvez seja verdade, uma verdade contraditória ou uma mentira na qual eu quero acreditar, repleta de palavras forjadas no calor de alguns momentos, mas que, agora, me parecem vazias...

Tocar seu rosto, suas mãos, seu cabelo... isso já me bastava. A espera pelo seu tempo, coisa que sempre prezei, me corroia e me matava toda vez. Sempre que passávamos horas conversando, mais dúvidas se criavam na sua cabeça, mas estar com você, sentir seu hálito quente, te ver corar a cada aproximação, isso me fazia mais vivo – e me matava também. Cada vez que você saía por aquela porta, ou que nos despedíamos na rua... a única coisa na qual eu conseguia pensar era no momento do reencontro, no momento em que eu ia te ver novamente, por casualidade ou num encontro furtivo.

Frio. O clima está todo propício para um gélido e doloroso adeus. Às vezes as pessoas falam barbaridades, despautérios e ofensas das mais duras e impensadas nestes momentos, mas o seu silêncio e a sua frieza foram muito mais cruéis que qualquer coisa que pudesse ser proferida em palavras. Acho que isso é o que vou levar disso – seja lá qual for o nome que você queira dar.

Como os seus personagens, aqui se apresentou e morreu um dos meus: o racional acima de todas as coisas, tentando ocultar a todo custo o passional. E sabe o que mais? Eu, como você, gosto de um drama, ¡ojos brillantes!

(Junho/2010)


quarta-feira, 23 de março de 2011

Desvivida. [1]

De feto, nada se lembra. Fantasia.
Sua primeira lembrança consciente data de quando tinha lá seus quatro anos - recém completados. No surrado sofá da sala, sente os primeiros movimentos na barriga de sua mãe. Não entende, de fato, o que significa a gravidez, o aumento da família, o ter um irmão. O único que sabia era o que via e o que, a partir disso, imaginava. Via o crescimento diário da barriga da mãe; via a felicidade coletiva que se espalhava a cada movimento daquele ser que nem viera ainda a este mundo; via brilhar cada vez mais os negros e profundos olhos da mãe.
Tardes inteiras de uma infância bem vivida: não se apegava à TV, aos programas infantis apresentados por estúpidos bonecos de pelúcia. Gostava de correr pelo quintal e brincar com seu cachorro. Montava-o como se fosse um cavalo. O bom e velho Branco não se importava com as travessuras do menino – ou talvez se importasse, mas não tinha força suficiente para resistir ou, ainda, suportava as estripulias na esperança de um afago e no dividir a cama com o dono durante a noite. Gostava ainda, o menino, do velho balanço. Passava horas na incansável distração de se balançar e ver os ramos das árvores se aproximarem e se afastarem, numa tediosa constante que - a ele - não cansava. Quando o balanço parava, se mantinha ainda sentado e observava as poucas nuvens que passavam no céu azul. Ficava imaginando objetos, rostos e toda classe de outras coisas corriqueiras que podiam se formar pelo lento movimento das massas brancas e disformes.
Acordou um dia com o cheiro de café que vinha da cozinha, feito por sua avó – sua mãe nunca fazia café – e acompanhado sempre por deliciosos biscoitos caseiros que sempre trazia para brindar o guloso neto. Estranha o silêncio da casa, mas não dá muita atenção, de qualquer forma. Passou o dia no seu vai e vem rotineiro pelo quintal. Entre o subir numa árvore e o atirar pedras no poço, um suco com bolachas servido pela devotada anciã.
Na manhã do dia seguinte, o cheiro de café novamente infesta todos os cômodos. No ambiente, o sentimento emanado não é a felicidade. As cortinas da casa ainda não foram abertas e a penumbra toma conta da sala, apesar do sol absurdo que faz lá fora. No rosto da avó e do pai, olheiras que denotavam uma noite mal dormida. No quarto, o leve choro do recém nascido, envolto em sua manta branca. No mesmo quarto, não encontra a mãe. Estranhamente, as roupas dela estavam todas em cima da cama. Os dias se passam e ela não aparece. Volta a brinca no velho balanço de corda. Olhava agora para as nuvens e tinha um rosto mais para procurar na abstração das nuvens.

[13.03.11]

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Inspiração

Discutem os tolos
sobre onde nasce a inspiração
se da presença dos vãos momentos de dor
-em cada um dos versos-
ou da singeleza de cada sorriso, da felicidade (in)contida
-em cada uma de minhas estrofes-
Me parecem vazios tais questionamentos
Não me pergunte de onde vem a inspiração,
porque eu jamais saberia te responder
me pergunte, sim, o quanto dói cada uma dessas palavras
ao sair de minhas entranhas putrefatas e vazias
-nos momentos de tristeza-
ou radiantes, coloridas -vivas- nos momentos de felicidade
E de que cor seriam, que aromas trariam, que palavras escolheriam
os momentos de dúvidas e incertezas
os que vivo constantemente, involuntariamente
escrevo em livre verso, verso livre, verso leve
-para que leve(m) meus versos-
mas livre não é o que eles são
condicionados sim, arrematados sim, engrenados, enjaulados(sim!), atordoados
Sim!
É isso o que eles são, é isso o que eu sou, é isso o que se espera
E assim será.