quinta-feira, 27 de maio de 2010

Quizá

Quizá como Neruda escriba
Veinte poemas de amor y una canción desesperada
Y te puedo aún escribir
Veinte canciones desesperadas más
Y tal vez ya ningún poema de amor

Sale de ese pecho -y del tuyo, quizá-
Un aliento ardiente que nos huele a poética
De estas tenieblas surge el clavel
El que ya inspiró épicas y líricas bélicamente pasionales
Y crónicas y cuentos más bien racionales

Pero ahora ya no más esas manos
Echarán dulces versos al aire
Por ti ahora muerto -polvoriento-
No en el plan de la realidad, aunque a veces en verdad lo deseé
Ya ahora sí lo está, en la subjetividad de mi piel

Auditorio

Se oyen charlas
Se oyen ponencias y tonterías
Y a vezes tonterías en ponencias
Y otras ponencias que son total tontería

Preciosos cambios
Y se oyen unos ecos de otras culturas
Y de otras épocas, de otros mundos y de otros imaginarios
Una muchedumbre de razgos y enfoques

Se habla de colonias y colonizador
De muerte y mestizage
Te oigo Neruda, te oigo darío
Y les simbolizo Verlaine y Baudelaire

Hispanófonos
Losófonos
Portuñófonos
Y ya está.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Prisões verbais

Às vezes o querer é mais forte - e mais irracional - que o poder
Às vezes o precisar é mais forte que o permitir
Às vezes o ultrapassar é mais forte que o limitar
Às vezes o sentir é mais forte que que o pressionar
Às vezes o mentir é mais forte - e mais necessário - que o confessar
Às vezes o criticar é mais forte que o aceitar
Às vezes o ser é mais forte que o gostar
Às vezes... só as vezes!

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Alice.

Era uma vez um menino que queria ser original.

Tinha um presente pra embrulhar e não sabia com o que - não queria os clichês de papéis azuis com ursos, bolas, pipas ou cavalos, queria algo que tivesse um significado (e na soma com seu devido significante virasse um signo) e resolveu fazer testes. Tinha em suas mãos um exemplar de Alice, numa bonita -na sua visão- edição de Alice, que tinha por sua vez os dois livros, com as ilustrações da primeira edição; era uma edição assim roxa e amarela, capa dura e desenhos d'Alice e do Gato. Cogitou algumas vezes usar uma das várias caixas de presente que tinha em seu guardarroupas (e em vários momentos esse mesmo menino tem dúvidas sobre as novas regras da nossa querida língua portuguesa), mas achou tudo muito sem graça e abortou rapidamente a idéia, como já abortou tantas outras nas últimas horas. Repensou se não deveria voltar aos papéis de presente expostos na papelaria do lado da sua casa, mas viu no fundo do armário um velho exemplar do Rascunho; na capa uma bonita definição de literatura, algumas cores que davam alegria à folha e decidiu que aquele seria o abrigo do presente. Cortou moldou e grudou, afim de que ficasse esteticamente agradável e afim, também, de que as palavras do surrado jornal ficassem descentralizadas no embrulho.

Escreveu então a dedicatória. Rabiscou rapidamente, como se o que escrevesse fosse um fluxo interminável que era apenas psicografado pelas suas gélidas mãos – e no fim, o que pareceu interminável na sua cabeça, não logrou passar de uma página, na realidade. O que ele fez? Apoderou-se das palavras de um jovem poeta que numa noite incerta conheceu, poeta esse que escrevia de forma singela, mas que sempre tocava nos pontos que para ele soavam como por si próprio vividos – sentia dor quando o poeta sofria, gargalhava quando ele estava feliz; escolheu dele alguns versos que pareciam ter sido escritos sobre coisas que o menino recém havia passado... mas logo percebeu que o poeta estava distante e não poderia estar falando sobre ele. Na última página, arriscou colocar um poema seu. Pensou muito em qual deles caberia para tal presente... talvez nenhum deles fosse a resposta correta, mas optou por um que até então não tinha mostrado a ninguém.

Em cinco minutos o pacote que demorou tanto tempo para ser pensado e moldado foi aberto, de uma forma tão cuidadosa que nenhum rasgo, pequeno que fosse, apareceu na folha do jornal muitas vezes lida. O menino afastou-se então e deixou que o receptor agora desfrutasse do que tinha nas mãos, que aproveitasse o presente que tinha muito mais ligação com o tempo atual do que o próprio nome, e na busca de uma fuga para sua existência controlada, encontrou o mundo dos espelhos.

No momento não me sinto tão vazio - e é até uma vergonha postar só isso depois de tanto tempo.


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