segunda-feira, 26 de julho de 2010

Um tango.

Dançamos colados
Mergulhados entre este nada
E aquela imensidão

Entre o tudo e o pouco
Entre o proibído e o que se pode
Envoltos por nossa cálida
Realidade paralela

O coração acelera
Com o infante repouso
E repousa com o leve toque
E volta a acelerar com a súbita investida

- difícil é saber se o coração que acelera, acalma e acelera, é o meu ou o seu-
Ou seriam ambos
Ou nenhum - e foi tudo um delírio




terça-feira, 13 de julho de 2010

II

E na fluidez da palavra
Me prende por horas seguidas
Que mais parecem minutos
Os quais persigo para que sejam mais

E no conforto do meu silêncio
Me protejo, me abrigo
Velo os meus segredos
Te poupo dos meus tédios

E no corar das mejillas
Transparece a timidez, transborda a doçura
-Aquece-

E me vejo em teus versos
Te escrevo em minha prosa
Vice, versa, verso -complementos-

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Senti(n)do

Vejo
Em linha reta um emaranhado de sedosos fios desgrenhados
Abaixo, debaixo, sobre:
Fito o lento movimento dos cílios
Abre, fecha, abre

Tateio
E espero o toque; e o leve roçar do seu braço da minha perna
O calor do atrito entre os corpos
União, conjunção, amálgama

Cheiro
Mesmo longe, a brisa
Mistura singularmente atrativa
Cigarro, perfume, suor

Ouço
O coração, o movimento
O respirar ao pé do ouvido
Arrepio

Degusto
Esse sabor tentas vezes provado, aprovado, querido, desejado
Lascivo, picante, penetrante
-Relembro-

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Limbo

Estava sentado num banco frio calçadão da XV de Novembro. Sentia o vento frio da madrugada congelar seus lábios. Que horas eram? Meia noite? uma, duas? Não podia ter certeza...

A outrora movimentada rua, agora padecia de um silêncio trazido pelo vazio das pessoas que ali não andavam. Sentado no banco, tateou algumas flores no úmido canteiro; levou uma ao nariz e inspirou o doce odor exalado pelas macias pétalas. Vez ou outra ouvia um leve ruído ao longe - ruídos não facilmente identificáveis: um carro, uma latinha que caía, talvez, uma conversa entre pessoas que passavam tão longe que pareciam cochichar, ouvia às vezes sons que não conseguia atribuir a nada que conhecia; ouvia também o som das folhas que balançava com o vento e de desprendiam dos altos galhos de cerejeiras e terminavam por pousar no chão, nos bancos e em seu casaco.

Sentia na boca - ainda - o gosto amargo do conhaque que tomara horas atrás na tentativa de amenizar o frio trazido com o sereno da noite. Meteu a mão em um dos bolsos do longo casaco e dele sacou uma bala de canela. Desenrolou-a pacientemente e pôs na boca. Certos gostos tinham para ele um sabor especial de nostalgia; às vezes tinham gosto de dor, de felicidade, de paixão. Canela. Lembrava-se bem do gosto de seus lábios - canela -, da textura que tinham e da doçura com que tocavam os seus. Lembrava-se da primeira vez que tocara seu rosto, do calor por ele emanado; lembrava-se de cada curva e de cada imperfeição do seu rosto - pra ele perfeito - e da forma como, ao seu toque, se aqueciam ainda mais as bochechas arredondadas. Gostaria de saber que fim levara, que caminhos seguira. Doce.
Com um pulo desperta. Ouve cair sua bengala.Abaixa-se e a traz para junto de si. Não sabe por quanto tempo seus olhos ficaram fechados - o que pra ele não faz, de fato, muita diferença.

Ficou ali sentado por muito tempo. Pensa em quanto tempo mais teria que esperar até que alguém que enxergasse - e a ele também - o conduzisse até sua casa. Talvez seus passeios noturnos sem destino devessem deixar de existir... afinal, poderia fazê-los durante o dia - a escuridão era a mesma.